terça-feira, janeiro 22

mãe, sai do meu espelho/ mum, get out of my mirror



Eu sou a cara do meu pai. Ou fui a cara do meu pai, já não sei mais.E a minha identidade ( identidades??) está (estão) em crise.
O negócio é que desde que eu me lembro por gente, eu ouço:
- Nossa, você é a caaaara do seu pai.
E assim eu alicercei a minha vida, a minha imagem, a minha identidade. Sendo a cara do meu pai. Sendo Ramalho. Sendo lá da Ramalhada ( por que na verdade, nós, os Ramalho,  temos todos  a mesma fisionomia.) 
Meu pai e as suas três irmãs são muito parecidos. Minhas primas e eu somos parecidas. Fato.
E por alguma razão que só Freud explica, eu sempre tive orgulho dessa semelhança.
Me lembro que aos 5 anos, meus olhos mudaram de cor. Eles eram azuis, como os do meu pai. Aí ficaram verdes.
As pessoas diziam:
- Que lindos olhos verdes!
- Não! Meus olhos são azuis, como os do meu pai.
- Não são mais. Agora são verdes.
E como diz o ditado "contra fatos não há argumentos", eu me desmantelava de chorar.Mas os meus olhos não se solidarizavam com a minha dor e nunca voltaram a ser azuis.
Só que de uns tempos prá cá, a minha mãe invadiu o meu espelho.
Eu estou andando pelo meu quarto, quando de repente dou de cara com ela na porta do guarda roupas. Ou estou destraída escovando os dentes, quando ela me olha, escovando os dela também. Já a peguei me seguindo na rua, me espiando pelos retrovisores dos carros, pelas vitrines de lojas em lugares mais inusitados. Minha mãe estava me espiando numa lojinha em Petra, no bazar no Cairo.
E aos 40 41 anos é dificil aceitar que você não é mais quem você sempre foi.
A Jussara do Palavras Vagabundas escreveu um post enorme sobre essa súbta mudança que ocorre na vida da gente, e o post dela veio a calhar. Foi logo quando a minha mãe começou a me perseguir pelos espelhos da vida.
No começo era uma olhada de esgueio, uma espiadinha de canto. Hoje a compania é constante. Eu olho em qualquer superfície refletiva e lá está ela, olhando de volta prá mim!
Não sei o que o Fábio anda achando de estar casado com a minha mãe, mas o meu alento é saber que daqui há 25 anos eu vou andar me esgueirando pelos espelhos da Anita e da Lia também.

Pai, eu sinto a sua falta! E meus olhos continuam verdes...

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I look like my dad. Or I looked like my dad, I don't  know more.And this creates a hell of an identity crisis.
Since I can remember, I hear:
- Wow, you look so much like your father!
And with that I created the fundation of my being. That was my life, my image, my identity. I knew no different. I looked like my father. I was Ramalho. I came from  Ramalhada - a neighborhood where most my family came from. We are all similar in appearance. My father and his three sisters look alike. My cousins ​​and I look alike. Fact.
And for some reason that only Freud can explain, I have always been proud of this similarity.
I remember being 5 years old,  when my eyes changed color. They were blue, like my father's and overnight they became  green.
People said:
- What beautiful green eyes you have!
My reply was always the same:
- No! My eyes are blue, like my father's.
- Not any more. Now they are green.
And as the saying goes "against facts there are no arguments", all I could do was cry. 
But recently, my mother moved into my mirror.
I'm walking around in my room when suddenly I stumble upon my mum staring back at me from my wardrobe's door.
I 'm distracted or brushing my teeth, when she looks at me, brushing hers too.
I already caught my mother following me on the streets, watching me through cars's mirrors, shop windows and the most unlikely places.
My mom was watching me even when I went to Jordan. I met her in several little shops in Petra, and in  the bazaar in Cairo.She is everywhere.
At 40 41, it is hard to accept  you are no longer who you always were.
A friend of mine wrote a post in Portuguese, about the changes she was experiencing, and how she looked more and more like her mother.
 It was right when my mother started chasing me in all reflective surfaces.
At first it was a shy look, and she would soon disappear. But slowly she became bolder and bolder. Today her company is constant. 
I look at any reflective surface and there she is, looking back at me - day or night!
The only thing that makes me smile,  is to know that 25 years from now I'll be sneaking into Anita and Lia's  mirrors too.

Dad, I miss you! And my eyes are still green ...

30 comentários:

  1. "Mas os meus olhos não se solidarizavam com a minha dor e nunca voltaram a ser azuis." - vai cagar, Inaie! hahahaha... Foi o que eu pensei, de posse dos meus olhos sem graca castanhos... hahahaha

    Sempre me disseram que eu sou a cara do meu pai... E acho que vai ser difícil ficar a cara da minha mãe... Mas quem sabe? Sera que nascerão cabelos loiros e brilhantes? Sera que meu narizinho vai deixar de ser batatinha e ficar pontudo igual ao dela? =)

    Achei lindo você falar que um dia Lia e Anita vão te ver pelos espelhos da vida... =)

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    1. "Mas os meus olhos não se solidarizavam com a minha dor e nunca voltaram a ser azuis." - vai cagar, Inaie! hahahaha.. (2)

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  2. Amei seu texto! Acho que principalmente pq me identifiquei com ele: todo mundo sempre me disse o quanto eu era parecida com meu pai, mas de uns tempos pra cá, arranjaram que sou tão parecida com minha mãe que me chamam de Tetelinha (o apelido da minha mãe é dona Tetela). Nos espelhos eu ainda nao a vejo, mas quase devolvi pra elas as fotos 3x4 que tirei esses dias, pensando que fossem dela...

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  3. Isso não acontece só com você. quando criança e quando jovem, sepre fui a cara do meu pai. Depois a maturidade foi chegando e aqui estou, cópia reprográfica de minha mã. Vai entender a natureza....

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  4. Ai que lindo o seu texto e a saudade do seu pai! Um dia todo mundo volta as origens, seja pelo pai ou pela mãe.

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  5. Chovendo no molhado, mas não tem outra coisa a ser dita: Que lindo!!! Me emocionei também.

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  6. Lindo seu texto... dá a entender, que você ainda tinha seu pai como seu herói, apesar das semelhanças. E depois, parecendo a sua mãe, não há como a gente querer um dia negar nossas raízes. bjo

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  7. Inaie, muito inteligente essa sua postagem. As coisas vão acontecendo assim mesmo. O bonito é a gente perceber e refletir sobre isso.
    Um abração
    Manoel

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  8. Só mais uma coisa: NUNCA vi minha mãe em mim, mas um ano antes de ir embora do Brasil eu olhava pra mim e só via ela.
    Será q tem a ver com saudade? Medo de perder? Amor?

    Acho q sim!

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  9. Um texto muito bom, onde você retrata o amor pelos seus pais.
    Lindo texto!...
    Beijos.

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  10. Segundo terceiros: Tenho o jeito de meu pai e a cara da minha mãe...

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  11. Adoei o seu texto!!!
    Já eu, dizem, não me pareço nem com meu pai nem com minha mãe. Na nossa família somos assim, todos diferentes dos pais, apenas minha irmã mais nova tem uma leve semelhança comigo. Quem sabe com o tempo vou encontrar algum deles no espelho?
    Costumava-se dizer que para um homem saber com quem estava se casando, bastava olhar para a sogra... Será que é verdade em pleno 2013???
    Mas eu já prefiro acreditar na publicidade da minha academia: "tenho o mesmo temperamento que a minha minha; para todo o resto, é XXX (nome da academia)."

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  12. Oi Inaie!
    Ouvi a vida toda que eu era igual o meu pai. Todo mundo dizia, não apenas para mim, para minha irmã mais velha e irmão, esses são a cara do pai. Até que um dia encontro com um primo da minha mãe que dispara: Mas se essa aqui não é filha da Idoraci (minha mãe), eu me dou um tiro no pé! Essa menina parece a mãe há 20 anos atrás. Fiquei pasma! Mas no fim das contas, é isso mesmo, tenho muito do meu pai, mas sou a cara da minha mãe.
    Beijos!

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  13. Ai, adorei seu texto Inaie!
    Que forma bonita de escrever se vendo como sua mãe! Também me vejo como a minha de vez em quando, e gosto, gosto muito, ela é tão querida.
    bjs cariocas


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  14. Sabe que eu passei pela mesmíssima coisa??? Sempre fui "a cara de meu pai" (sem os olhos azuis dele, só que os meus são castanhos sem graça, como disse Luana) e de uns tempos pra cá minha mãe tá me olhando no espelho! E me vejo "ontem", em minha filha... que quando era pequena, era a cara do pai!
    Enfim, a gente muda, sim... e não me pergunte como nem porque, não tem explicação. Se eu gostei da mudança? Ainda não sei.
    Bjooo

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  15. Mas que belo post, Inaie querida!
    Você escreve bem, a gente fica leve.
    Gosto de pessoas que possuem a capacidade de expressar seu mais profundo de uma forma light.
    Eu ando ficando parecida com a mamis também. Eu, que sempre fui a cara de papai...
    Beijossssssssss
    Vero

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  16. Oi Inaie.
    Às vezes nos parecemos com um,às vezes nos parecemos com o outro.
    Com certeza você tem características marcantes tanto do seu pai quanto da sua mãe e tenho certeza de que só herdou o melhor dos dois.

    Bjs.
    Elvira

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  17. Muito legal o seu post...me vejo assim tb...a cada dia que passa fico mais parecida com minha mãe. Não só na fisionomia, mas em coisas que ele fazia na casa dela e que eu faço na minha. Adorei mesmo esse post...parabéns...beijos

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  18. Inaie,gostei do seu post e queria dizer que gostaria muito de me ver como minha mãe(que era linda),nos espelhos da vida. Mas não me vejo não...pior,dependendo do corte do meu cabelo, me vejo como a tia LIDE!Paciência! Bjs

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  19. Inaie,
    Moça você é mesmo uma cronista, imaginei a emoção da sua mãe lendo esse texto tão sensível e afinado. Curioso isso né, eu não me vejo fisicamente nos meus pais, mas me pego muitas vezes incorporando a Carolina, minha mãe,horas o João meu pai.
    Bjs

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  20. Sempre nos espelhamos com alguém, mas quando a mãe é uma pessoa especial, o reflexo brilha mais. Já pensou na sorte das suas filhas?

    :oD

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  21. Oi Inaiê, embora eu tenha olhos escuros, pele morena e cabelos cacheados, todo o resto é da família do meu pai! Até nas manias, gostos e neuroses! Sabia que lá é todo mundo doidão e ouve rock?
    Eu sempre fugí disso porque sou mais chegada à família da minha mãe. Eu vivo com a minha avó materna!
    Não tenho nada da minha mãe!
    Qual foi a solução que eu encontrei? Eu digo que de uma avó eu puxei a cara e a outra eu puxei a bunda! hahahaha

    Beijos e acho que esse tipo de relfexão é muito bonito e todo mundo se pega fazendo na vida! Quando vejo as fotos da minha avó paterna na juventude, ainda mais que são em preto e branco, o que não evidencia o fato dela ser ruivona (os cabelos ficam pretos na fotos), eu me vejo! Todo mundo me vê!
    Incrível! Eu sou ela com cor e narizinho larguinho!
    Pai, sai do meu espelho!!!

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  22. Só algumas pessoas conseguem sair dos olhos azuis para um verde! São lindos de qualquer forma! Realmente, eu tb acho que sou muito a cara do meu pai, hoje consigo ver alguma coisa da minha mãe em mim.

    Kisu!

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  23. Adorei este post, você realmente escreve muito bem, viu? E a reflexão é interessante...eu também sempre fui parecida com meu pai fisicamente (hoje em dia bem menos) mas em termos de temperamento e gostos, sou muito parecida com a minha mãe - herdei as principais qualidades e defeitos dela, além de predisposição para algumas doenças...mas isso é outro assunto!

    Venho sempre aqui mas não comento pouco...De qualquer forma, admiro seu alto astral e do jeito divertido que conta estórias. Já ri sozinha algumas vezes lendo seus posts!!!

    Beth (Noites em Claro)

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  24. Ianie,
    só o primeiro "Bom dia, mãe!" é que assusta, kkkk depois a gente se acostuma. Adorei o texto,e vou "roubar a ideia", Fernanda e Helena me esperem em seus espelhos daqui uns anos!
    bjs
    Jussara

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  25. Lindo! Adorei o recado da mamae coruja. Abracos. marcia

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  26. Ah, que lindo ver vc e dona Cirlei! Adorei!!! Nem consegui notar a semelhança, mas fiquei feliz de ver as duas. Posta aí uma foto com o pai também, pra gente comparar! Bjoca, querida!

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